quarta-feira, 12 de maio de 2010

Direito de resposta e dano moral

Devido a denúncia contra empresa clandestina e concorrência desleal que fiz no jornal Folha Patense, veículo da comarca de Patos de Minas (MG), fui vítima de comportamento antiético e criminoso da redação e de sua errônea ou tendenciosa interpretação da Lei de Imprensa: após minha denúncia, o jornal publicou difamação contra mim, assinada, óbvio, pelo concorrente.

Veja a que nível um jornal pode descer: escancarar nada menos que uma página para um desconhecido (e suspeito) escrever o que bem entender contra seus denunciantes. Agora, os editores querem furtar-se da responsabilidade civil e criminal com dois truques: maquiaram a difamação com o pseudônimo de "Direito de Resposta" e fazem ingênuo uso da forjada alegação "Não nos responsabilizamos por artigos assinados", impressa em todas as edições, mas sem nenhum valor legal. Só está lá graças à confiança na ignorância dos outros, ou à própria. Já pensou se para a imunidade bastasse o rótulo mágico "não nos responsabilizamos..."? Ciente de meus direitos, pedi auxílio a instituições de regulamentação da ética jornalística e publicitária, há meses, sem obter nenhuma resposta. O incidente aconteceu em janeiro.

Em 24 de janeiro, a direção da Folha Patense informou-me que a matéria "Empresa clandestina faz concorrência desleal, impune e abertamente", na qual denunciava plágio de peça publicitária de minha autoria, gerou pedido de resposta, o qual eu só poderia ler no dia seguinte, depois de publicado no jornal (o que aconteceu em 26 de janeiro). O diretor de Redação disse ainda que ele próprio não havia lido o Direito de Resposta (DR), e "o advogado do proprietário da empresa denunciada o entregaria diretamente na gráfica". Diante de meu alarme a propósito daquela difamação anunciada, a redação argumentou que eu "deveria ter pensado nisso antes de ter começado o caso".

Ora, quem começou o caso foi quem copiou minha campanha publicitária. Que o DR seria reivindicado era mais que previsível, mas que o jornal o publicaria sem ler é inacreditável. O jornal sapecou o texto, confundindo Direito de Resposta com Direito de Retaliação. Questionado por que publicaria algo que certamente me prejudicaria, sem uma investigação sobre sua origem, o diretor da Folha, 20 anos de praia, disse que igualmente não investigou se a matéria que eu havia escrito era verdadeira (!). E quis me dar uma aula da Lei de Imprensa, imposta na época da ditadura.

Segundo ele, o Direito de Resposta teria de ser dado na mesma página e com o mesmo espaço reservado ao primeiro artigo. "Inclusive com chamada de primeira página", como havia sido feito no meu caso. Disse que sempre dá direito de resposta, e citou vários exemplos. Explicou que o DR é obrigatório "sempre que alguém se sinta prejudicado pelo jornal". Liguei para o diretor em sua casa para saber se o jornal realmente não investigaria as informações contidas no Direito de Resposta. Ele disse que não podia fazer nada a respeito, e que eu não poderia ler a matéria "porque o outro também não havia lido o meu artigo com antecedência"! E ainda reclamou que eu havia lhe causado um prejuízo de uma página por ter de publicar o tal direito. Falei que ele estava se arriscando a piorar as coisas, pois dependendo de uma calúnia, ou algo que o valha, eu reivindicaria réplica, ocupando mais uma preciosa página e entediando o leitor. A solução para isso foi rapidamente encontrada pelo diretor: ele publicaria a resposta e mais nada a respeito, ou seja, daria ao outro a palavra final, estando ele mentindo ou não.

Advertido de que publicar uma resposta às escuras talvez lhe trouxesse complicações, o diretor de Redação afirmou que o "Direito de Resposta é de responsabilidade de quem escreve, e não do jornal". A Folha Patense, receio, interpretou minha compreensível preocupação como sinal de culpa.

Quando vi o texto, feito por advogados, fiquei menos preocupado e vi que o objetivo principal do Direito de Resposta era antes amenizar o estrago feito à imagem da empresa clandestina do que revidar. Tanto é esse o objetivo que o título contém um eufemismo: "Quadro a Quadro repudia boatos". "Boatos"? Ora, imputação de crime é "calúnia", muito mais grave. Por que mediram as palavras? Para me poupar? Mas, em todo caso, a Folha errou, infelizmente:

1. O conteúdo de um Direito de Resposta só não é de responsabilidade do jornal quando este é dado pela Justiça, o que não foi o caso. E, como veremos, o único Direito de Resposta possível é este aqui, que, ironicamente, a Folha relutou em publicar.

2. É óbvio que o DR não é concedido em todos os casos. Qualquer calouro sabe disso. Só é concedido para o caso da divulgação de notícias "comprovadamente infundadas". Se não, para cada página policial, haveria outra página correspondente – para os bandidos. A redação da FP desconhece que o Direito de Resposta não é o mesmo que um debate literário que a gente vê na grande imprensa. O editor o dá quase sempre ao escritor criticado, pois é matéria jornalística e pode ser dado ou negado arbitrariamente, chamado de "réplica". Mas não existe um "Direito de Réplica" ou "Direito de Tréplica". O DR é uma sentença, e o dono da Folha posa de juiz, pré-julga e condena, sem direito a apelação. No mínimo, deixando a multidão decidir, como o próprio Pilatos.

3. O direito de quem comete um delito e é citado em qualquer órgão é exatamente o contrário: o "direito de permanecer calado". Na opinião de um nobre amigo, a atitude do jornal deveria ser a de submeter o texto a mim, e, se eu quisesse, o publicaria em minha página, rebatendo seu conteúdo, como, aliás, sempre fiz.

4. Admitindo o DR, o jornal, age como se ele próprio afirmasse, por sua conta e risco, que minha matéria é falsa e merecia retificação. Agora cabe ao jornal apresentar as provas do que publicou. E o diretor de Redação sequer pode dizer que foi por falta de aviso. Alertei a redação para o fato de que um DR subtende uma absolvição dada pelo jornal. Liguei para ele até o último instante, pedindo que apurasse a versão do Direito de Resposta, sem que me desse ouvidos, novamente dizendo-me para esperar a publicação no dia seguinte. Novamente não quis saber de provas, se da minha parte ou da outra. Se eu deveria ter pensado antes de escrever, a redação deveria ter pensado duas vezes mais, antes de publicar ambos os textos.

5. Diferentemente do DR, minha matéria foi entregue na manhã de quarta-feira, e o fechamento do jornal se dá na madrugada de sexta, havendo tempo suficiente para o jornal averiguar sua veracidade, até porque a empresa citada é vizinha da Folha e a Ama Propaganda (onde trabalho) fica quase em frente.

6. Se o jornal for incapaz de apurar os fatos ("Não é nossa função investigar", disseram), deveria ter deixado esse trabalho para a Justiça. Agora não vai ter de investigar de qualquer maneira, para se defender? O pior é que o jornal fez isso apenas "para não ficar mal com seu mais próximo e recente vizinho", segundo me relataram.

7. A princípio o diretor disse que não havia lido a matéria sobre a empresa clandestina, estopim desta crise, que eu havia deixado em sua mesa. Depois desmentiu, admitindo que a havia lido, percebido sua seriedade e que a publicou porque confiou em mim. Ora, o jornal confiou em mim tanto quanto eu nele.

8. Quem leu apenas o DR vai pensar que o denunciado rebateu satisfatoriamente todas as acusações. Não saberá que omitiu uma série de fatos que foram descritos – e talvez nem vá ter tempo de comparar um texto com o outro. Mesmo quem leu meu artigo não vai se lembrar de tudo, e a tendência é sempre acreditar em quem dá a palavra final e obteve o silêncio do outro que, subentende-se, calou-se. Mesmo que eu tenha ouvido "entendidos" me dizendo que o DR foi "muito vago" e "não respondeu nada", o contingente de pessoas que ficou perdido na cortina de fumaça e que me ligou para saber o que estava acontecendo não é nada desprezível.

9. Se o jornal admitiu ter errado em não investigar, nada o impediria de fazê-lo a qualquer momento, mesmo depois de ter publicado a minha página. Em vez disso preferiu errar de novo, publicando um texto sem ao menos lê-lo, dizendo que "a página 9 iria para a gráfica com o espaço em branco reservado para o Direito de Resposta", do que duvidei. Tudo isso mediante uma peculiar e suspeitíssima condição imposta pelo meu oponente: eu não poderia ler o texto antes.

Este é um caso de desrespeito gravíssimo, que encaminhei ao Sindicato dos Jornais, Revistas e Similares do Estado de Minas Gerais (Sindijori), à Associação Nacional de Jornais (ANJ), em Brasília, à ABI e à Fenaj (Federação Nacional de Jornalistas).

(Observatório da Imprensa, 2002)
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