
“Não sei quais armas serão usadas na Terceira Guerra, mas a Quarta Guerra Mundial será com paus e pedras.”
Essa feliz frase de Albert Einstein (1879-1955), Nobel de física cuja teoria viabilizou a construção da bomba Atômica (Projeto Manhattan), apresenta-nos com autoridade científica e propriedade histórica ao palpitante século 21. Sabotagens virtuais? Terrorismo-catástrofe? Agentes microscópicos?
Passado pouco mais de um mês do desabamento do WTC, é possível recordar-me de que, ao ligar a TV em obediência a um telefonema, senti-me privilegiada testemunha ocular de uma passagem bíblica. De algum modo, a Cable News Network (CNN) estava transmitindo a segunda destruição da Torre de Babel, ao vivo! Não estou sendo ingênuo ou exagerado ao afirmar que, diante da confusão e hipnotizados pelo sensacionalismo televisivo, muitos tínhamos certeza de que assistíamos à extinção — incrivelmente rápida — de todos os Estados Unidos, quer pelo nítido sucesso da primeira fase de um suposto ataque mundial, quer por ser obra de Deus ou de bestas apocalípticas.

Mas rapidamente nos acostumamos com a idéia de um atentado. Apesar da convicção de Washington contra o partido Taleban desde o início, não tive a mesma facilidade em focalizar de imediato a origem dos ataques: não pela dificuldade em reconhecer algum inimigo da América, é claro, mas, pelo contrário, por seu enorme contingente potencial: Coréia do Norte, China, Cuba, Síria, Irã, Líbia, Sudão e cartéis do crack, além de organizações políticas da extrema direita e grupos paramilitares dos próprios EUA... Todavia não descartei a possibilidade de os camicases serem japoneses legítimos pondo a termo seu próprio “Projeto Manhattan”.
Pelo menos, não comprei a antítese barata e maniqueísta que os líderes políticos Bush e Bin Laden vendem em suas aparições midiáticas (“ou vocês estão conosco ou contra nós” diz um, e “esses acontecimentos dividiram o mundo em dois campos, o campos dos fiéis e os campos dos infiéis”, diz o outro). Os dois são mais parecidos do que gostaríamos de admitir, evocando Deus, justiça e liberdade, enfatizando o honroso sacrifício de vidas (alheias) no dever de manter ou alcançar a paz. Do mesmo modo que as ações do Al-Qaeda confirmam as acusações dos americanos, os bombardeios em Cabul só corroboram as denúncias contra os EUA. Falando nisso, os militares americanos, aproveitando que renomeariam a operação “Justiça Infinita”, poderiam rebatizá-la, em vez de “Liberdade Duradoura”, de operação “Olho por Olho”, dada sua natureza retaliativa. A expressão “São ataques terroristas!”, de Bin Laden, e “Nossas exigências não foram atendidas e agora eles vão pagar por isso”, dito do presidente norte-americano, aceitam sem prejuízo a inversão da autoria. De determinadas frases, se publicadas isoladamente, é impossível identificar o orador, se George bi Laden ou Osama W. Bush.

Mas o arquétipo no qual Bin Laden melhor se encaixa é Batman. Ambos os magnatas aplicam a herança dos pais no patrocínio de suas guerras particulares, impelidos por vingança e fanatismo. Armados até os dentes, Bruce Wayne e Osama bin Laden se refugiam em cavernas hi-tech, bases de suas atividades ilegais.
Em “O Cavaleiro das Trevas” (veja ilustrações), o Homem-Morcego é julgado e depois perseguido pelo governo Reagan. Bin Laden é produto da indústria americana, seja porque é síntese do que os americanos cultuam e exportam, seja porque foi treinado pela CIA. Aliás, quem garante que ele ainda não esteja a soldo, mesmo sem saber, daquela organização secreta, cuja existência sempre dependeu das intrigas que dissemina? Quantos bilhões de dólares realmente a CIA abocanhará do orçamento nacional após o êxito em Nova York?
(Folha Patense, outubro de 2001)
ombudsboy@gmail.com